sexta-feira, 2 de abril de 2010

FAZES_ME FALTA

“ No entanto tu amaste-me ainda mais quando te tomei e comi a alma, quando te neguei para melhor me afirmar.”
“ Concentrei-me em deixar de ser para poder ser tudo, em esquecer para dominar a existência (…) estou esgotado de correr contra a dor, contra a memória, contra a infância, contra o amor e o ódio. Criei uma meta de tranquilidade que se afasta tanto mais quanto mais corro para ela. Não há paz no instante, e eu vivo de instante para instante. Começo a temer que a paz se alimente do sangue da paixão de que abjurei.”
Os seres que criáramos precisavam de nos matar para sobreviver. E nós deixámo-nos matar, porque está na natureza do amor estilhaçar-se sem ruído, desfazer-se em vidros e pesar-nos no lugar do coração até que a morte o restaure.”
“ Encosto-me à porta da casa onde deixei um dia a minha alma morta, julgando que apenas largava a pele. A porta de casa onde umas cem vezes o amor me abraçou a bom recato, disfarçado de sexo. Ele está lá, deitado no chão onde começou a matar-me, muitos anos antes da minha morte.”
O teu silêncio esmaga-me. Já não sei procurar as gargalhadas, correr para a alegria momentânea dos regatos. Sou a tua vítima, agora culpado de tudo o que não fiz.”“ O meu amor por ti atinge agora o auge. Já não possuo nada a que me agarrar. Nem o teu corpo, nem a minha razão, nem a vida, lá fora. As pessoas que te conheciam não te servem agora. Lembra-se de ti como de uma morta. Inventam-te. Fazes-me falta. Não te consigo inventar.”
“ Quando tu existias, o vento era apenas o vento. Cada coisa tinha uma forma exacta e uma história de duração. Perdi a natureza que me fazia durar quando te perdi.”
E levaste-me para a cama. Enroscaste-te em mim e começaste a coçar-me as costas, muito devagar. Dormimos muitas e muitas vezes assim – e nunca, nem por um segundo, pensamos em fazer aquilo a que os inocentes chamam sexo.”
“ Derramei sobre a tua vida, por incontáveis noites, os meus breves amores perfeitos, pormenor a pormenor. E tu derramaste sobre a minha as tuas paixões impossíveis, impossíveis de apagar. Desejo-te tanto, ainda.”

Inês Pedrosa, " Fazes-me Falta"

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